Amianto: Entidades e profissionais querem banimento já

Crédito: Assessoria de Imprensa

Por Luiz Carlos Azenha

O Instituto Brasileiro do Crisotila (IBC) tentou calar o pneumologista Hermano Albuquerque de Castro,  pesquisador do Centro de Estudos de Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana, da  Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Interpelou-o judicialmente  por causa de pesquisa sobre mesotelioma e  declarações à imprensa em relação aos malefícios à saúde humana da fibra  assassina.

O mesotelioma, tumor maligno que pode aparecer até 50 anos após o primeiro contato com o amianto,  atinge pleura (membrana que reveste o pulmão), pericárdio (membrana que recobre o coração) e peritônio (membrana que reveste a cavidade abdominal). É extremamente agressivo, incurável e fatal. Hermano Albuquerque de Castro detectou o aumento de casos de mesotelioma nos últimos anos, principalmente, no Estado de São Paulo.

“O amianto não é apenas uma questão de saúde ocupacional”, alertou-nos na primeira das cerca de 40 reportagens que fizemos sobre o assunto desde julho de 2008. “É um problema de saúde pública.”

Profissionais e entidades que atuam nas áreas de saúde do trabalhador, pública, coletiva e estudiosos sobre câncer e patologias do aparelho respiratório, que já haviam apoiado individualmente Hermano Albuquerque de Castro, agora saíram coletivamente em defesa do pesquisador da Fiocruz, lançando o documento Amianto: A polêmica do óbvio. Um consenso de peso, representativo, que reivindica também o banimento já do amianto no Brasil.

“Considerando que o controle de exposição ocupacional ou ambiental ao amianto é inviável e  que ele é reconhecidamente cancerígeno, não se justifica a continuidade de sua utilização  no Brasil e no mundo”, afirma  o médico pneumologista Eduardo Algranti, um dos maiores especialistas do país na área e signatário do documento.  “Não importa a ótica de análise: ambiental, social, tecnológica ou econômica.”

Algranti é chefe do Serviço de Medicina da Fundacentro e membro  do  Comitê Assessor em Saúde Ocupacional da Organização Mundial da Saúde (OMS).

“É inadmissível que, por motivos econômicos e alegações técnico-científicas que não se sustentam na prática, persista a pressão por parte de grupos com forte interesse na manutenção do seu uso no Brasil”,  ressalta Algranti a esta repórter. E antecipa um panorama sombrio: “Mesmo que seja banido a curto prazo, infelizmente continuaremos a diagnosticar casos de doenças associadas ao amianto ainda daqui a muitas décadas. E sem bola de cristal”.

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AMIANTO: A POLÊMICA DO ÓBVIO

Nas últimas semanas, o tema Amianto voltou a ganhar espaço na mídia nacional e internacional. No Brasil, em consequência à interpelação judicial, promovida pelo Instituto Brasileiro do Crisotila, contra o Dr. Hermano de Castro Albuquerque, pesquisador do Centro de Estudos do Trabalho e Ecologia Humana, FIOCRUZ, relacionada a achados de pesquisa sobre o mesotelioma, publicado em um periódico científico, e por suas declarações na mídia sobre riscos para a saúde associados à exposição ao amianto.

Essa repercussão foi potencializada pelo julgamento criminal ocorrido em Turim, Itália, condenando dois ex-proprietários de ramos do Grupo Eternit por omissão de informações sobre os problemas de saúde associados à manipulação do amianto, e quase 3 mil mortes que ocorreram entre ex-trabalhadores e habitantes do entorno de uma de suas empresas em Casale Monferrato.

Há duas décadas, profissionais brasileiros de renome na área do trabalho, médica e ambiental vem, de público, advertindo sobre as desastrosas consequências da manutenção da utilização do amianto no Brasil. Infelizmente, o Estado Brasileiro se esquivou, repetidamente, do problema, não respeitando o valor constitucional de proteger seus cidadãos. Nos últimos anos, perderam-se diversas oportunidades de proibir seu uso no território nacional. Perdeu-se também, a oportunidade de evitar que o risco continue a se estender a populações de outros países importadores do asbesto brasileiro (praticamente, todos com condições sanitárias tão ruins ou piores que a nossa).

Estima-se que mais de sete milhões de pessoas morram de câncer anualmente, em todo o mundo (Jemal A, et al. CA CANCER J CLIN 2011). Hábitos pessoais e condições de ambiente são responsáveis por 40% dos casos de câncer, o que significa que cerca de 3 milhões de óbitos anuais poderiam ser prevenidos.

O ambiente de trabalho é responsável por 4 a 20% de todos os casos de câncer na população. Dentre estes, o amianto, isoladamente, é responsável por 1/3 dos casos e, restringindo-se apenas ao câncer de pulmão de origem ocupacional, a parcela do amianto chega a 50% dos casos. Percentual ainda maior ocorre em relação ao mesotelioma, um câncer raro da membrana que envolve os pulmões, de péssimo prognóstico, no qual o amianto é o agente causal de mais de 80% dos casos. Dados do Sistema de Informações de Mortalidade do Ministério da Saúde mostram uma curva francamente ascendente de mortes por mesotelioma em São Paulo.

Atualmente, o Brasil é o terceiro maior produtor mundial de amianto. Entre 1975 e 2005, o mercado brasileiro consumiu 5 milhões de toneladas, traduzido em produção, transformação (produtos de cimento-amianto e outras centenas), instalação, remoção e descarte. Entre 2008 e 2010 a produção aumentou, assim como a importação e o consumo interno. Em 2010, o consumo estimado foi de 0,9 Kg/brasileiro. Estes produtos estão espalhados pelo ambiente.

Não é necessário esforço para entender que o problema extrapola o ambiente de trabalho. A chance de um cidadão se expor ao amianto, assim como a outros cancerígenos reconhecidos, aumenta na proporção do seu uso.

A nocividade do amianto crisotila é inconteste, classificado desde 1987 dentro do Grupo 1 das substâncias carcinogênicas pela Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC), organismo da Organização Mundial da Saúde (OMS). Isto significa que há suficientes evidências experimentais e epidemiológicas que permitem classificá-lo como cancerígeno para humanos.

A OMS e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) entendem que a única forma de se prevenir as doenças associadas ao amianto é através da cessação da sua utilização (http://www.who.int/occupational_health/publications/asbestosrelateddiseases.pdf, http://www.ilo.org/public/english/standards/relm/ilc/ilc95/pdf/pr-20.pdf). Em adição ao câncer de pulmão e do mesotelioma, o amianto é, também, causalmente associado ao câncer de laringe e câncer de ovário (www.thelancet.com/oncology, Vol. 10 Maio 2009).

Sob o conceito de “fato relevante”, a Eternit no Brasil encaminhou matéria paga a veículos de grande circulação, em que tenta se distanciar da gravidade da questão, reduzindo um grave problema de Saúde Pública a uma suposta querela comercial e de disputa de mercado. Apega-se, de má-fé, à Lei Federal no. 9.055/95, cuja flagrante inconstitucionalidade já tem parecer favorável do Ministério Público Federal e do Ministro Relator do STF, e ainda, tenta desqualificar a inteligência e a sensibilidade dos legisladores dos estados onde o amianto já foi proibido, reduzindo o clamor de milhares de vítimas das doenças do amianto crisotila, à suposta pressão de concorrentes da Eternit.

A “utilização segura” e o “uso controlado” do amianto, no seu ciclo de vida e ao longo da cadeia produtiva, são conceitos enganosos e inviáveis. Quem controla a sua “utilização segura” na construção civil? Quem controla a sua “utilização segura” em manutenção de máquinas, equipamentos e instalações que o contenham? Quem controla a sua “utilização segura” em reformas e demolições? Quem controla a contaminação de locais previamente utilizados para armazenamento e/ou a produção de produtos contendo amianto? Quem controla o descarte de materiais contendo amianto após o seu uso?

Qual é a necessidade de se manter a sua produção e uso? Há substitutos seguros para todas as utilizações conhecidas do asbesto. Nenhuma fibra substituta faz parte da lista de cancerígenos da IARC. Em adição, há estudos que demonstram a viabilidade técnica e econômica de sua substituição.

Como cidadãos e profissionais ligados à Saúde, registramos a indignação pela manutenção da produção, transporte, consumo, descarte, exportação e importação do amianto, e conclamamos o Poder Legislativo, o Poder Judiciário e o Poder Executivo Federal que se unam para acelerar as iniciativas pelo banimento total do amianto crisotila no Brasil, imediatamente.

Que o Brasil não faça vexame na Conferência Rio + 20, de junho, e consiga mostrar – a nós e ao mundo – que suas políticas públicas não são definidas pelos lobbies de uma empresa, e sim, são comprometidas com a defesa da saúde e do ambiente, como reza a Constituição Federal.

Subscrevem o documento as seguintes Instituições/Organizações e Profissionais

INSTITUIÇÔES/ORGANIZAÇÕES

Associação Brasileira de Centros de Informação Toxicológica (Abracit) – Fábio Bucaretchi, Presidente

Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco)– Luiz Augusto Facchini, Presidente

Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea) –  Eliezer João de Souza, Presidente

Associação Nacional de Medicina do Trabalho (Anant) — Carlos Campos, Presidente

Centro de Estudos de Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana, CESTEH/Fiocruz — Marco Antonio Carneiro Menezes, Diretor

Fiocruz, Ministério da Saúde (MS) — Valcler Rangel Fernandes, Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde

Fundacentro, Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) — Eduardo Azeredo Costa, Presidente

Instituto Nacional do Câncer (Inca),Ministério da Saúde — Luiz Antônio Santini Rodrigues da Silva, Diretor

Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia–  Roberto Stirbulov, Presidente

Sociedade Brasileira de Toxicologia — José Luiz da Costa, Diretor Presidente

Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia Mônica Corso Pereira — Presidente

Sociedade de Pneumologia e Tisiologia do Estado do Rio de Janeiro — Luiz Paulo Loivos, Presidente

PROFISSIONAIS (ordem alfabética)

Adriana Skamvetsakis — Médica do Trabalho do Centro Regional de Referência em Saúde do Trabalhador da Região dos Vales, RS

Álvaro Roberto Crespo Merlo –  Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Ambulatório de Doenças do Trabalho – Hospital de Clínicas de Porto Alegre

Ana Paula Scalia Carneiro Pneumologista — Médico do Serviço Especializado em Saúde do Trabalhador do Hospital das Clínicas da UFMG

Andréa Silveira – Professora do Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina da UFMG

Antonieta Handar –– Médica do Centro Estadual de Saúde do Trabalhador do Paraná

Carlos Augusto Vaz de Souza — Engenheiro, mestre em Saúde Pública, responsável pela Coordenação-geral de Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde

Eduardo Algranti –– Chefe do Serviço de Medicina da FUNDACENTRO e Membro do  Comitê Assessor em Saúde Ocupacional da OMS

Eduardo Marinho Barbosa– Professor do Núcleo de Tecnologia em Saúde do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia da Bahia

Eduardo Mello De Capitani — Professor de Clínica Médica e coordenador do Centro de Controle de Intoxicações da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp

Eliezer João de Souza — Presidente da Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea)

Elizabete Medina Coeli Mendonça – Tecnologista do Serviço de Medicina e responsável pelo Laboratório de Função Pulmonar, Fundacentro

Elizabeth Costa Dias — Professora do Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina da UFMG

Fátima Sueli Neto Ribeiro — Doutora em Epidemiologia, professora adjunta da UERJ

Fernanda Giannasi — Engenheira, auditora fiscal do Ministério do Trabalho,  gerente do Programa Estadual (SP) do Amianto e coordenadora da Rede Virtual-Cidadã pelo Banimento do Amianto na América Latina

Francisco Pedra– Médico Sanitarista e do Trabalho, CESTEH /Fiocruz

Frida Marina Fischer-– Professora titular do Departamento de Saúde Ambiental da Faculdade de Saúde Pública – USP

Guilherme Franco Netto-–  Doutor em Epidemiologia, pós em Saúde Coletiva. Diretor do Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador – Ministério da Saúde

Gustavo Faibischew Prado –– Doutor em Pneumologia pela Faculdade de Medicina da USP,  Médico da Divisão de Pneumologia do InCor-HCFMUSP e do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp)

Hermano Albuquerque Castro — Médico Doutor do CESTEH, Fiocruz/MS, Coordenador da Comissão de Doenças Ambientais e Ocupacionais da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia

Ildeberto Muniz de Almeida — Professor do Departamento Depto de Saúde Pública da Faculdade de Medicina de Botucatu – Unesp

Jefferson Benedito Pires de Freitas – Médico pneumologista do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador da Freguesia do Ó e professor instrutor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo

José Augusto Pina — Pesquisador do Centro de Estudos da Saúde do trabalhador e Ecologia Humana (CESTEH) da Fundação Oswaldo Cruz/Fiocruz

Jussara Maria Rosa Mendes — Professora do curso  de Serviço Social e do PPG Psicologia Social e Institucional da UFRGS, Coordenadora do NEST (Núcleo de Estudos em Saúde e Trabalho)

Luiz Augusto Facchini – Professor do Departamento de Medicina Social da Universidade Federal de Pelotas (RS)

Luiz Carlos Correa Alves — Médico do CESTEH/Fiocruz

Luiz Paulo Loivos –Médico pneumologista, presidente da Sociedade de Pneumologia e Tisiologia do Estado do Rio de Janeiro

Márcia Bandini – Médica doutora do Trabalho, Diretora da ANAMT

Maria Cecília Pereira Binder – Professora do Departamento de Saúde Pública da Faculdade de Medicina de Botucatu – Unesp

Maria Dionísia do Amaral Dias –Professora  do Departamento Saúde Pública da Faculdade de Medicina de Botucatu – Unesp

Maria Juliana Moura Corrêa–  Professora da Escola de Saúde Pública do Estado do Rio  Grande do Sul

Mario Bonciani – Médico — Vice-presidente nacional da ANAMT e auditor fiscal do Trabalho aposentado

Patricia Canto Ribeiro — Médica, coordenadora da Comissão de Pneumopatias Ocupacionais e Ambientais da Sociedade de Pneumologia e Tisiologia do Estado do Rio de Janeiro (SOPTERJ)

Paulo Antonio Barros Oliveira — Médico do Trabalho, professor da UFRGS, Auditor Fiscal do Trabalho do MTE, vice-presidente da ABERGO (Associação Brasileira de Ergonomia) e diretor executivo da ULAERGO (União Latino Americana de Ergonomia)

René Mendes – Professor titular do Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina da UFMG

Rodolfo Andrade de Gouveia Vilela — Professor do Departamento de Saúde Ambiental da Faculdade de Saúde Pública – USP

Ubirani Barros Otero — Médica, gerente da área de Vigilância do Câncer Relacionado ao Trabalho e ao Ambiente, Coordenação de Prevenção e Vigilância – Conprev/INCA

Ubiratan de Paula Santos–Coordenador da Comissão de Doenças Ocupacionais e Ambientais da SPPT, médico do Grupo de Doenças Respiratórias Ocupacionais do Instituto do Coração (InCor) do HCFMUSP

Victor Wunsch Filho – Professor titular do Departamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da USP

Vilma Santana — Professora do Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia, Programa Integrado em Saúde Ambiental e do Trabalhador

Vilton Raile — Médico, coordenador do Núcleo em Saúde do Trabalhador de Carapicuíba

Zuher Handar – Diretor científico da ANAMT, médico do Centro Estadual de Saúde do Trabalhador do Paraná – CEST

Fonte: Blog Vi o Mundo (http://www.viomundo.com.br)