Estado debocha da Justiça e nega remédio

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Nos primeiros dois meses deste ano, o Estado de São Paulo foi condenado 172 vezes a fornecer medicamentos de baixo e alto culto a doentes. A Justiça determina que a Divisão Regional de Saúde de Rio Preto cumpra a determinação em até dez dias, sob pena de multa diária de R$ 500 a R$ 700. Mas, na prática, a Saúde Estadual tem descumprido a ordem e deixado pacientes esperando até 6 meses para ser atendido. É o caso do aposentado Cláudio Dornelas, 69 anos, que ganhou uma ação em 16 de setembro do ano passado, mas até agora não recebeu o medicamento Lioresal (baclofeno), na forma injetável, indicado para acabar com espasmos musculares.


O paciente passou por uma cirurgia no pescoço para retira de um bico de papagaio, que comprimia a medula, e precisa do medicamento para acabar as dores agudas provocadas pelas contrações. “A demora é muito grande, mas como não temos dinheiro, somos obrigados a esperar. Enquanto isso, ele sofre e corre risco de ficar inválido”, afirmou a mulher do aposentado, Venina Mônica Dornelas. Sem o remédio, que funciona como um potente relaxante muscular, o músculo retrai e fica a cada dia mais curto. 

A mulher afirma que para pagar o medicamento – que tem custo médio de R$ 800 – tem de deixar comprar produtos de necessidade básica para casa. O casal é aposentado e recebe cada um apenas um salário mínimo (R$ 622) por mês. O advogado Neimar Leonardo dos Santos, do Grupo de Amparo ao Doente de Aids (Gada), responsável pelo ingresso de 25 ações por mês contra a Saúde, afirma que a alegação do Estado de que a demora se deve ao processo burocrático de licitação para a compra dos produtos é infundada. “A lei prevê que em casos emergenciais, como compra de remédio, não é necessário o pregão.”

O advogado diz que, por causa da demora na entrega dos remédios aos pacientes – em média de 60 dias -, pediu a execução de cinco multas contra o Estado. Todas foram acatadas pela Justiça. A aposentada Matilde Abrahão Olivieri, 87 anos também aguarda há dois meses pelo medicamento Enablex (darifenacina). De acordo com a aposentada, o Estado deveria ter entregue o medicamento nos dias 2 de fevereiro e 2 de março, porém, até hoje, ela não recebeu nenhum frasco.

“Tenho incontinência urinária, preciso do remédio para controlar a bexiga. Não posso comprar porque custa muito caro e eu não tenho condições, ganho pouco”, afirma a idosa. A filha dela, Sueli Olivieri, disse que a mãe, sem o remédio, acorda todos os dias urinada, devido a incontinência. “Ela tem uma alergia e também não pode usar fralda geriátrica. O remédio é essencial para a melhora na qualidade de vida dela”, afirma. Cada frasco do remédio custa em média R$ 200.

De acordo com o defensor público Júlio César Tanoni, o número de ações contra o Estado tem caído desde 2009, quando a Secretaria Estadual de Saúde passou a disponibilizar para os pacientes com câncer os medicamentos mais comuns e mais modernos direto no Hospital de Base de Rio Preto. “De lá para cá houve uma grande diminuição das ações, mas mesmo assim, a defensoria elabora em média 20 ações mensais para solicitação de medicamentos, número ainda considerado elevado”, explica Tanoni.

O defensor diz ainda que o Estado, na maioria dos casos, atrasa a entrega dos remédios para os pacientes. Levantamento feito pelo Diário apontou que dentre as ações judiciais as mais comuns são remédios para diabetes, hipertensão arterial, câncer, Aids e outras doenças que requerem tratamentos contínuos, em média, só nos primeiros meses do ano, foram quatro condenações por dia.

Ação

As pessoas que necessitam de remédios de alto custo que não constam na lista de medicamentos disponíveis na rede pública de saúde podem procurar a Defensoria com a documentação necessária. Um formulário deve ser preenchido com os dados pessoais com a necessidade do tratamento e entregar documentos com as negativas das secretarias municipal e estadual sobre a medicação requisitada, além de uma fundamentação do médico responsável pelo paciente com detalhes da doença e a necessidade do remédio descrito. O mesmo procedimento pode ser realizado através do Gada.

Não é necessário entrar com ações’, diz Estado

A Secretaria de Estado da Saúde divulgou nota ontem informando que a pasta segue a lista federal e que muitos medicamentos solicitados não fazem parte da lista de remédios definida pelo Ministério da Saúde para distribuição na rede pública. “Entretanto, não é necessário entrar com ações na Justiça contra a Secretaria, uma vez que a pasta disponibiliza um canal de solicitações administrativas de medicamentos não padronizados pelo Ministério, que são avaliadas individualmente com base em evidências científicas sobre a eficácia terapêutica dos produtos prescritos”, informa a nota.

Segundo o Estado, compras de remédio são solicitadas imediatamente após a decisão da Justiça. Mas ressalta que, quando se trata de medicação importada, sua chegada ao país fica condicionada à autorizações de importação da Anvisa e desembaraço alfandegário por parte da Receita Federal. “Em todos os casos de decisões judiciais, a Secretaria inicia o processo de compra tão logo recebe a notificação. Além do processo de importação, outros fatores podem prejudicar a entrega dos medicamentos aos pacientes, como, por exemplo, pregões que “fracassam”, ou seja, nenhuma empresa oferta o produto. A Secretaria deve, obrigatoriamente, seguir a Lei de Licitações para aquisição de medicamentos, materiais e insumos”.

A secretaria classifica como “preocupante que haja indiscriminada enxurrada de decisões judiciárias obrigando prefeituras, Estados e o Ministério da Saúde a comprar medicamentos não padronizados, alguns dos quais sem registro no Brasil ou, ainda, utilizados em tratamentos experimentais”. Do mesmo modo – acrescenta a nota da assessoria – é preocupante que haja um sem número de liminares determinando a entrega de medicamentos já distribuídos na rede, mas que não são daquela marca específica prescrita pelo médico do paciente, além de decisões que obrigam o governo a distribuir itens não relacionados a terapia medicamentosa, como fraldas descartáveis e xampus, entre outros.

fonte: Diário da Região – São José do Rio Preto – 10/2/2012, através do PT Alesp