Linha 4: primeiro passo para a privatização do metrô
Há pouco tempo tivemos uma falha no sistema da Linha-3 que fez dois trens se chocarem. Se isso acontecesse na Linha-4, seria uma tragédia, opina Narciso Soares, do Sindicato dos Metroviários de São Paulo. Enquanto as Linhas 1, 2 e 3 são administradas pelo Metrô (Companhia do Metropolitano de São Paulo), a Linha-4 Amarela funciona no regime de Parceria Público-Privada (PPP) e é gerida pela ViaQuatro, do grupo CCR.
O operador do trem da Linha 3 Vermelha puxou o freio e evitou maiores danos na Amarela, no entanto, não há operadores. Para economizar, que é a lógica do setor privado, tiraram o operador. É uma tragédia anunciada, denuncia Narciso. A lógica não é melhorar o sistema para andar menos lotado, ao contrário, é superlotar cada vez mais. Para ter um transporte público de qualidade é preciso inverter essa lógica. O transporte não está aí para dar lucro, e sim para atender os interesses da população. Infelizmente, não é isso que acontece no estado de São Paulo nem no resto do Brasil, completa.
O contrato de concessão da linha previa que o governo estadual seria responsável por 73% do investimento, enquanto o setor privado arcaria com os 27% restantes. Em função dos atrasos na obra (o governo estadual demorou a desapropriar os terrenos, gerando multas) e mudanças no método construtivo (que fez o Metrô pagar uma indenização de 200 milhões de dólares à ViaQuatro), o investimento público alcançou a proporção de 85%. O interesse público foi deixado de lado para permitir negócios privados em função de um serviço essencial que o estado de São Paulo deveria executar e gerir. A Linha-4 é o primeiro passo para futuras Parcerias Público-Privadas, denuncia o deputado estadual Simão Pedro (PT).
Ele questiona as causas do acidente ocorrido nas obras da Estação Pinheiros em 2007, quando sete pessoas morreram soterradas após a abertura de uma cratera. Para o parlamentar, o buraco de 80 metros de diâmetro foi consequência da mudança do método de construção, feita para apressar a obra. A falta de supervisão da equipe do Metrô sobre a construção também teria sido um fator que contribuiu para o acontecimento. As empresas privadas eram as responsáveis pela construção. Elas querem fazer as obras em menos tempo, visando o lucro.
Por que o metrô vem sendo sucateado? A construção do metrô de São Paulo é a mais cara do mundo porque tem um esquema de desvio de dinheiro, de pagamento de propina. Há um acerto entre várias empresas, um cartel. Um consorciamento para fatiar as licitações, denuncia Simão Pedro. Ele explica também como funciona o esquema adotado pela concessionária para supervalorizar as reformas dos trens: estas chegariam a custar 85% do preço de um trem novo, valor extremamente alto se a venda da sucata for levada em consideração. Há também uma nova licitação para a reforma dos freios e aranhas (suportes dos trens), cujo preço equivale a 150% do valor dos equipamentos novos.
Wagner Fajardo Pereira, do Sindicato dos Metroviários, explica que a companhia estatal que seria criada pelo governo estadual com a função de recolher o dinheiro oriundo das tarifas do Metrô nunca saiu do papel. A missão foi repassada para a SPTrans, que já administrava as finanças do sistema de ônibus. A empresa repassa o dinheiro das tarifas do Bilhete Único priorizando, nesta ordem, o sistema de ônibus, o Metrô controlado pela iniciativa privada (Linha-4) e a CPTM (Companhia Paulista de Transporte Metropolitano). Logo, o Metrô estatal arca com os custos das tarifas gratuitas de idosos, deficientes, policiais militares e a meia-tarifa dos estudantes, o que gera um menor repasse para as linhas estatais. Existe um grande repasse de dinheiro público para garantir o lucro das empresas privadas. A propensão é aumentar ainda mais: aumentar as tarifas e diminuir a qualidade, alerta Narciso Soares.
O deputado federal Ivan Valente (Psol) analisa: É uma combinação desastrosa e o povo é quem paga o preço. Há uma comunhão com as grandes empreiteiras. O PSDB tem uma lógica de mercado privatizante, atrelada à especulação imobiliária. O transporte é um direito dos cidadãos e um dever do Estado. A administração tem de caminhar para algo transformador e revolucionário.
Fonte: Carta Maior