Mesotelioma: campanha deve esclarecer sobre a doença e fortalecer a luta contra o amianto

“Essa é uma luta que vai além de uma entidade, de uma ideologia. Essa é uma luta pela vida”. Foi com essa afirmação que o deputado Marcos Martins deu início ao Ato Solene de lançamento da campanha estadual Mesotelioma: você conhece essa doença?, que aconteceu na noite de terça-feira, 10, na Assembleia Legislativa de São Paulo. O evento foi organizado pelo parlamentar.

A campanha tem caráter elucidativo e deverá levar mais informações à população sobre a doença, um dos tipos mais dramáticos de câncer causados pela exposição às fibras do amianto.

O ato contou com importantes nomes do cenário de luta pelo banimento do produto no mundo e marcou uma nova e importante etapa da trajetória pela conscientização e completa eliminação do amianto no país.

Além do deputado estadual Marcos Martins, autor da lei 12.684/07 que proíbe os usos do amianto no Estado de São Paulo, também compuseram a mesa do evento a líder internacional da luta, Laurie Kazan-Allen; o presidente da Abrea (Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto) Eliezer João de Souza; a auditora fiscal da Delegacia Regional do Trabalho de São Paulo, do Ministério do Trabalho, Fernanda Gianasi; a repórter de série sobre o tema, Conceição Lemes; a Coordenadora de Prevenção e Vigilância do Câncer, Dra. Silvana Rubano Barreto Turci, do INCA (Instituto Nacional do Câncer); a Dra. Simone Alves dos Santos, representante da Vigilância Sanitária, da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo; o Dr. Eduardo Algranti, médico da FUNDACENTRO (Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho), órgão colaborador da OMS (Organização Mundial da Saúde); a arquiteta Susana Mulhman, da Agência de Protecion Ambiental Del Governo de La Cuidad de Buenos Aires, Argentina; José Elias de Góis, do CISSOR (Conselho Intersindical de Saúde do Trabalhador de Osasco e Região); Dr. Mauro Menezes, advogado defensor das leis de banimento do amianto; o vereador de São José dos Campos, Tonhão Dutra; a professora Dra. Renata Zoudine, viúva de engenheiro vítima do amianto, que representou as famílias enlutadas; e Geraldo, diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos.

“O dia de hoje é mais uma batalha que faz parte de uma verdadeira guerra contra essa doença que mata cerca de 100 mil pessoas por ano em todo o mundo”, destacou o deputado Marcos Martins, citando índice revelado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).

O parlamentar fez questão de cumprimentar os membros da Abrea pela persistência e força nessa luta. A entidade leva a bandeira pelo banimento do amianto a outros estados, apesar das dificuldades, com o objetivo de estender a luta para todo o país.

Diante de vítimas do amianto presentes ao Ato, o deputado Marcos Martins fez questão de repudiar a tentativa do deputado Waldir Agnello de derrubar a lei paulista 12.684/07, apresentando Projeto de Lei 917/2009 à Casa, uma atitude considerada desumana pelos participantes do evento. Segundo denuncia a ABIFibro (Associação Brasileira das Indústrias e Distribuidores de Fibrocimento), “A simples leitura de seus artigos, no entanto, deixa claro que a intenção não é estabelecer normas de transição mas, sim, revogar a lei em vigor, retirando-lhe toda a eficácia, notadamente no que se refere ao banimento do amianto”.

Os convidados fizeram uso da palavra e levaram ao evento informações importantes do cenário mundial da luta contra o amianto.

AMIANTO: BOMBA RELÓGIO NO ORGANISMO HUMANO

A Dra. Silvana Turci, do INCA, apresentou o lançamento da campanha que é nacional e levou informações sobre a situação geral no mundo. Segundo dados da UICC (União Internacional Contra o Câncer), o cenário é alarmante. Em 2002, estimavam-se 10 milhões de casos novos de mesotelioma, com 6 milhões de mortes. Para 2020, a estimativa é ainda pior e estima-se 15 milhões de casos novos, com uma taxa de 12 milhões de óbitos.

A representante do INCA também fez questão de ressaltar os principais fatores de risco para câncer de pulmão, que são tabagismo e amianto.

Laurie Kazan-Allen, líder mundial da luta que estuda a catástrofe do amianto há 20 anos, destacou a falta de dados e de um levantamento seguro de casos da doença. Para ela, essa deficiência na informação é tão grave quanto a própria doença. Laurie avalia que o pior momento das consequências do amianto à saúde humana ainda está porvir. O período de latência da doença é de 10 a 40 anos.

Num panorama geral da doença no mundo, Laurie citou o continente europeu, devastado pelo mesotelioma e outras doenças causadas pelo amianto, como asbestose. Uma estimativa aponta de que entre 1995 e 2029 cerca de 250 mil homens deverão morrer por causa da doença, e esse número poderá dobrar, chegando a 500 mil. Outros países considerados em alerta máximo também foram citados, como a Índia e a Grã-Bretanha, que apresenta hoje a mais alta taxa de mesotelioma do mundo.

Laurie alertou para o fato de que países em desenvolvimento são alvo do lobby do amianto, o que tem culminado no aumento do uso do produto. Porém, entre os 13 principais países que utilizam o amianto, o Brasil, a Rússia e Zimbábue têm assumido a luta pelo banimento.

A arquiteta Susana Mulhman, levou informações sobre como a Argentina lida com a questão. No país, o asbesto é proibido desde 2006 e o cuidado para lidar com edificações e outros produtos que contém o amianto é rigoroso.

AS CARAS DA LUTA

Outros personagens de grande expressão dessa luta, deram sua contribuição ao Ato Solene.

A jornalista Conceição Lemes, repórter de série sobre o tema, parabenizou o deputado pela iniciativa, que considera essencial para o vigor da luta. Lemes comentou os bastidores de suas reportagens e enfatizou o lobby do amianto. A jornalista comparou o asbesto à própria doença. Para ela, o amianto invade a todos os segmentos da sociedade da mesma forma que a doença se espalha no organismo humano.

Lemes enfatizou ainda, que a indústria do amianto fatura cerca de 2,5 bilhões por ano. Nesse cenário, a Eternit se destaca e detém 70% do mercado brasileiro do asbesto.

O Dr. Eduardo Algranti, médico da FUNDACENTRO, ressaltou a necessidade de se obter mais apoio de entidades, como já acontece com Abrea e o Inca. Para ele, esse apoio é fundamental para se apurar o quadro da doença no país e levantar números seguros.

Um dos defensores da luta contra o amianto na esfera jurídica, o Dr. Mauro Menezes apontou a proteção essencial à saúde como direito de todo cidadão, e com base nisso, declarou que considera um verdadeiro retrocesso social a proposta do deputado Agnello, que para Eliezer, presidente da Abrea, “é repugnante”.

O diretor do sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, Geraldo, diz que “a luta contra o amianto é uma luta contra os grandes industriais e contra o capitalismo” e reforça a participação da entidade no combate ao vilão amianto. Em homenagem às vítimas, Geraldo pediu um minuto de silêncio durante sua fala.

Emocionado, José Elias de Góis, presidente do CISSOR, lembrou de amigos que trabalharam em empresas como Eternit, e que foram vítimas do amianto. Ele questionou os valores éticos e morais daqueles que militam em favor da poeira assassina, como chama o amianto, e saudou os companheiros que tem investido seu tempo e competência pelo banimento do asbesto, como é o caso do deputado Marcos Martins e os demais que compuseram a mesa.

“A questão do amianto não tem fronteiras, nem capacidade, nem classe social, todos estamos expostos a esse risco”, destacou Goís. Para ele, se valer do amianto e conviver com esse vilão é uma verdadeira roleta russa. “Nunca sabemos qual dos nossos companheiros estará doente no ano seguinte”, lamentou.

Representando as famílias enlutadas, a professora aposentada, Renata Zoudine, viúva de engenheiro que trabalhou na Eternit e faleceu de mesotelioma, relatou o período de doença de seu marido, emocionando aos presentes e mostrando o lado real de quem perde com o uso do amianto.

A representante da Vigilância Sanitária, Dra. Simone Alves dos Santos, enfatizou a importância da lei 12.684/074 do deputado Marcos Martins, como respaldo para a atuação do órgão no combate ao uso do amianto.

Por fim, a auditora fiscal do Ministério do Trabalho, Fernanda Giannasi, cumprimentou a todos, também parabenizou o deputado Marcos Martins pela iniciativa, e fez questão de apresentar as vítimas do amianto presentes ao evento. Para ela, “não há melhor argumento contra a insanidade de parlamentares e empresários que tentam manter o uso do amianto”.

SOBRE A DOENÇA

Mesotelioma é um tipo raro de câncer que tem um longo período de latência, podendo chegar há 30 anos e atinge, em sua maioria, a pleura, como acontece em 81% dos casos. A doença acomete, em sua maioria, homens na faixa dos 50 anos. Cerca de 20% dos casos pode sofrer metástase.