O amianto e seus rastros

Crédito: Assessoria / MM

Nos primeiros dias de junho deste ano familiares e amigos das mais de 3 mil vítimas do amianto na Itália puderam comemorar o aumento da pena criminal do empresário sueco Stephan Schmidheiny, sócio da empresa Eternit de Casale Monferrato (Itália). Schmidheiny teve sua pena aumentada de 16 para 18 anos. Foi uma vitória também para os trabalhadores que jamais terão contato com a danosa substância e para os que lutam pela integridade da saúde dos trabalhadores.

Falta caminhar. Cerca de sessenta e seis países já aboliram o amianto e no Brasil apenas os estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Pernambuco e Mato Grosso o fizeram. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde, estima-se que a cada ano morrem 100 mil pessoas que foram expostas aos produtos extraídos e seus derivados.

Na Europa o amianto parou de ser produzido quando a lei apertou o cerco. A repercussão do caso Eternit também ajudou. Dentre os responsáveis por essa luta, destaca-se um grupo de italianos formado por dois sindicalistas e dois procuradores, que deram a guinada inicial para rebentar a causa, espalhando pelo mundo informações acerca da importância de banir o amianto. O que sobrou da substância na Europa foram apenas resquícios, estruturas de construções que vão sendo gradualmente arrancadas e devidamente descartadas – aspecto também importante da questão, já que o simples manuseio da fibra ou aspiração pode levar à contaminação.

Para banir o amianto

Segundo o deputado estadual Marcos Martins, autor da lei 12.684/07, que proíbe o amianto no estado de SP, para alcançarmos resultado similar alcançado pelos países que já aboliram a substância, e que hoje não produzem e nem a aplicam mais, o ideal seria que o Brasil pensasse simultaneamente três questões: 1. Proibição, por leis municipais, estaduais e federais, da extração, industrialização, utilização, comercialização e transporte do amianto e dos produtos que o contenham; é necessária também a inclusão de uma cláusula de proibição do uso do amianto em editais de licitação de obras; 2. Substituição de estruturas e produtos feitos de amianto por materiais que não contenham a substância; 3. Correto transporte e descarte de produtos que contenham amianto.

 

Caso Eternit é discutido no MPT de Campinas

MPT Campinas recebe procuradores e sindicalistas italianos que trabalharam no caso Eternit. A cidade brasileira contabiliza quase 800 casos de contaminação por amianto

O procurador do Ministério Público do Trabalho de Campinas, Ronaldo Lira, conta que o MPT onde trabalha tem notificadas quase 800 ocorrências de casos de contaminação por amianto no país. Justamente por causa dessa apuração que Campinas, no interior de São Paulo, foi a cidade escolhida para sediar, no dia 12/6, o II Ciclo de Palestras 2013 do MPT, “O amianto no banco dos réus: o processo do século – Caso Eternit”

 

Compuseram a mesa de palestrantes do evento o deputado estadual Marcos Martins, autor da lei 12.684/07, que proíbe o uso do amianto no estado de São Paulo; os procuradores italianos Sara Panelli e Gianfranco Colace, ambos envolvidos em toda tramitação do processo contra a Eternit de Casale Moferrato (Itália); o sindicalista metalúrgico e coordenador da AFEVA (Associação dos Familiares e Vítimas doAmianto), Bruno Pesce; Nicola Pondrano, ex-trabalhador da Eternit de Casale Monferrato e hoje Presidente do Fundo Italiano das Vítimas do Amianto; e a auditora do Ministério Público do Trabalho,  Fernanda Giannasi. Também esteve presente o vereador Ângelo Barreto, de Campinas, que frisou a dificuldade que é manter a cidade livre do amianto, embora haja sua proibição pela lei do município.

A maior fábrica que manipulou o amianto na América Latina, a Eternit, saiu da cidade de Osasco no ano de 1993, deixando para trás casos e mais casos comprovados de contaminação por amianto. Um rastro de destruição. O mesmo fez a Lonaflex fábrica de lonas e pastilhas, deixando a cidade um ano depois. Esta ainda voltou a realizar um trabalho de triagem e diagnóstico dos antigos empregados, cumprindo com o dever de zelar pela saúde dos antigos funcionários por 30 anos, conforme explicita a lei.

“Não se respeita à saúde, a vida e nem a legislação. O lobby do amianto quer continuar com o uso da substância mesmo que seja às custas da saúde e até mesmo da vida dos trabalhadores. Só o que conta para eles é a ganância e o lucro”, ressaltou o deputado estadual Marcos Martins, que há 18 anos, desde seus mandatos como vereador, luta pelo banimento do amianto ao lado de instituições como a ABREA (Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto).

Os procuradores e sindicalistas italianos reconstruíram e forneceram aos presentes maiores detalhes sobre o caso da Eternit italiana, considerado “processo do século”, sobretudo pelos envolvidos com o tema.

Confira trechos dos relatos das demais autoridades que compuseram a mesa:

Nicola Pondrano – “Quando entrei na Eternit em Casale Monferrato eu era um jovem. Do ponto de vista estratégico, a empresa era importante porque dava emprego a milhares de trabalhadores. Depois todos foram adquirindo a percepção que o amianto matava não apenas nas fábricas, mas matava na cidade também. (…) São denúncias que dizem que a Eternit é uma fábrica de morte”.

Bruno Pesce – “Qualquer movimento contra o amianto deve ser acompanhado. Não se pode deixar o trabalhador sozinho e sem trabalho. É necessária uma proteção e intervenção do estado para reinserir o trabalhador em outro emprego ou na mesma fábrica quando esta for readequada”.

Gianfranco Colace – “A fibra do amianto é indestrutível, é como uma bomba dentro de nosso corpo. Do ponto de vista da produção, o amianto é muito bom. Mas dentro do corpo é como… como uma roupa que nunca poderemos tirar!”.

Sara Panelli  – “Nós tínhamos um elemento em mãos: a omissão da empresa no que diz respeito às normas de segurança do trabalho. Com base em outros elementos, como a análise das doenças, juntamente com o resultado do trabalho pericial, tínhamos provas contundentes contra a Eternit”.